Ontem por um acaso encontrei com um amigo de infância. Foi engraçado o momento, pois ele ficou cheio de cerimônias sem saber como se dirigir à mim. Quando menino ele me chamava de Nego D’água, por viver pelos açudes e pelos barreiros, pescando e tomando banho. Eu lhe chamava de Ferrugem, por ele ser uma mistura de negro com branco, tipo sarará. Um cara fabuloso, e muito inteligente. Ficamos alguns minutos sem pronunciarmos os nomes um do outro, ele sabia o meu mas me tratava por poeta; já eu não lembrava o dele, só o apelido. Pense num negócio chato.
Outro dia fui advertido por um leitor mais atento, de que eu havia cometido um descuido e estava sendo politicamente incorreto, quando em uma crônica eu descrevia a penumbra de um abajur sobre um “criado mudo”. Até quis mudar a frase, mas depois, pensei: Não, não vejo nada além de uma ingênua descrição sobre uma mesinha pequena que, denominada de criado mudo, me auxiliava no momento em que eu escrevia com a pureza da alma a emoção de um encontro casual.
As palavras são livres e devem voar sem serem podadas suas asas. O céu é o limite quando um poeta resolve voar em direção ao infinito, e as barreiras do som devem ser rompidas, pela velocidade do pensamento, depois que as palavras aceleram a rotação da engrenagem do juízo.
Penso que há um certo exagero em ralação às normas que regem algumas leis imprescindíveis, criadas para proteger uma determinada classe social, como também penso que deve-se manter algumas referências identificativas, as quais estão no subconsciente das pessoas que amamos, e que nos conhecem como tal. Por exemplo: Algumas dezenas de amigos meus, desde a infância me chamam de Negão, de Nego, de Neguim de Heleno, e por aí vai… Sempre me senti acarinhado em ser tratado assim; percebo porém, um certo desconforto por parte deles ao se dirigirem à minha pessoa, depois que o politicamente incorreto tornou-se penalidade.
Enfim… Eu sou negão e o meu coração é a liberdade. Pode me chamar de negão, de neguim, de nego, desde que venha com um sorriso estampado na cara, e de braços espalhafatosamente abertos, que é pra poder fazer valer o abraço.
Um ótimo domingo pra todos.