Já não escuto mais aquela música, arranhou o disco, mudei de som, mudei o tom, e aquela melodia se enganchou numa teia de aranha, mofou o mote e desmetrificou nas sílabas tônicas de um soneto que tinha tudo pra ser uma bela canção. “Ah! Bruta flor do querer, ah bruta flor, bruta flor…”. Em meus desmantelos, o acaso é quem rege a ópera da minha rebeldia. Não me digam pra onde vou, não queiram calar meus versos, não travem meus sentimentos, não me peçam mais para ser certo, não apontem dedos em direção ao meu nariz, senão escarro na arrogância de quem assim vier. Não me digam onde devo ir, pois, só eu sei onde devo chegar. Não sou além, não sou aquém, não sou de ninguém, mas sou de quem gosta de afago, de carinho e de afeto. Na bagunça dos meus sentimentos, sempre acho um retrato não esquecido, e em seu amarelado, tem o pigmento de algum instante de prazer. Foi dentro da desordem de minha bagunça que que aprendi a dizer não a quem nunca me diz sim. Foi dentro da minha bagunça que eu encontrei o verdadeiro sentido da vida. Foi dentro de minha bagunça que achei este poema de Carlos Pena Filho:
“Quando, pelo desuso da navalha,
a barba livremente caminhar,
e até Deus em silêncio se afastar,
deixando-te sozinho na batalha,
a arquitetar na sombra a despedida
do mundo que te foi contraditório,
lembra-te que afinal te resta a vida,
com tudo que é insolvente e provisório
e de que ainda tens uma saída:
Entrar no acaso e amar o transitório”.