Ainda mais, o Brasil precisa de paz. Somos um país dividido, fraturado, triste. E seria bom ter logo de volta o brasileiro como exemplo do “homem cordial”, como na definição (Raízes do Brasil) de Sérgio Buarque de Holanda. O que se vê, nos olhos de tantos brasileiros, é sobretudo rancor. Dizia Shakespeare (Henrique VII) que “são benvindos os que trabalham para a paz”. Mas quem seriam estes?, leitor amigo.
Primeiro responsável pela pacificação do país deveria ser o chefe do governo. A tentação de o comparar com Mandela, na transição de uma ditadura branca para a democracia de todas as cores na África do Sul, é irresistível. Mas o resultado acaba sendo lamentável, que nosso presidente com certeza não é Madiba.
Depois de condenado em três instâncias, e passar 580 dias de prisão, trata-se hoje de um prejudicado na convivência com os contrários. E, a depender dele, vai parar só quando metade do país estiver na prisão. Os responsáveis por aquela condenação e ainda, talvez, todos aqueles que não votaram nele. Porque escorre, de sua boca, o fel amargo da vingança.
Na sua falta, o Congresso Nacional poderia ocupar esse vazio na busca por um país melhor. Só que Senadores e Deputados parecem mais interessados em suas emendas, ou nos fundos partidários, ou nos redutos eleitorais que os elegem, incapazes de compreender o papel redentor que poderiam exercer. Perdem uma chance que não vai se repetir facilmente, em nossa história.
Num cenário assim, o órgão que deveria responder pela pacificação do país seria então o Supremo. Só que ele hoje responde, ao contrário, pelo clima de guerra permanente que o país vive.
O ministro Alexandre de Moraes é o principal responsável pelo que ocorre; e, basta ver nos seus olhos, deseja sangue. Jornalistas sugerem que teria algum problema médico (guardo relação com os diagnósticos sugeridos); mas, como não tenho meios para opinar sobre essa área, e em respeito ao Supremo, prefiro passar ao largo do tema. Até por reconhecer que papel ainda pior cumprem seus colegas de tribunal ao preferir ficar mudos, ante isso tudo ‒ por medo, corporativismo, ou cumplicidade.
Uma ministra, que ficou célebre por ter dito a frase “Cala a boca já morreu”, em louvor à Liberdade de Expressão, passou a censurar, sem angústias aparentes, nossas redes sociais. Rindo. Segundo o jornalista José Neumanne Pinto, seu lema agora passou a ser “Cala a boca já”.
Outro ministro, faz pouco, disse “o Supremo já não é mais uma instância de julgar processos, agora é uma entidade política”. Como?, amigo leitor . Quem for consultar a Constituição verá, no seu art. 102, que competência do Supremo é apenas “julgar”. Ponto final. Sequer pode investigar (o que vem fazendo, à larga), ver art. 129, uma atribuição exclusiva do Ministério Público. Onde está, na Constituição, que a Côrte pode ser uma instância “Política”? Essa nova atribuição lhe foi outorgada por algum poder da República? Está em qual Emenda Constitucional? Foi objeto de Plebiscito Popular?
Quando se fala na sacralidade da justiça, traduzida pelo povo na frase “decisão da justiça não se discute, se cumpre” (ainda resquício de uma visão renascentista), tem-se em mente que ela julgou algum caso. E, jamais, que isto seria decisão de uma “entidade política”, de um como que novo Partido que espalha suas garras atropelando a Constituição.
No fundo quem controla o Supremo?, eis a questão. A resposta é fácil. Segundo a mesma Constituição, isso cabe ao Senado ‒ art. 52, II. Mas, aqui para nós, alguém acredita que seu presidente, Rodrigo Pacheco (réu em processo que corre no Supremo em “sigilo” e com julgamento suspenso desde 2015, como uma Espada de Dâmocles), vai dar início a um processo de impeachment ou algo assim?
Enquanto isso, milhares sofrem nas prisões (inclusive donas de casa e velhos, alguns doentes, fora os que já morreram), ou exilados, ou proibidos de falar, ou desmonetizados, em processos absolutamente ilegais. Outros, nós todos, vivemos em permanente censura.
Não somos o primeiro país que bloqueou redes sociais. Outros já o fizeram antes como China (2009), Irã (2009), Turcomenistão (2010), Coreia do Norte (2016), Rússia (2022), Venezuela (2023). Que bela companhia, senhores. Diferente é que, em todos esses países, foi o Governo quem bloqueou as redes. O que nos torna o primeiro país do planeta em que um tribunal restringe o direito de falar, ao proibir que se opere uma rede social.
Por tudo, amigo leitor, há uma onda de indignação no ar. E precisamos de paz. Essa mesma paz que para Jacques Prévert (A chuva e o tempo bom) é “tão bela, tão frágil, e sempre ameaçada”. Só que ela não está à disposição, hoje, é pena. Em resumo, aparentemente, não há luz no fim do túnel. E, até desconfio, nem túnel há, por enquanto, no horizonte de nosso Destino.
José Paulo Cavalcanti Filho
jp@jpc.com.br