Esses dias, ouvi em um canal da mídia afirmando que uma crise geopolítica estaria se aproximando. Eu diria, então, que MAIS uma crise geopolítica estaria se aproximando…
Superado os duros impactos da pandemia, passamos a enfrentar a invasão da Rússia na Ucrânia, além de, no final de 2023, o mundo foi surpreendido com novo confronto envolvendo Israel e o grupo terrorista Hamas, que se desdobrou em uma crise no Oriente Médio, quando rebeldes Houthis, do Iêmen, começaram a atacar navios no Mar Vermelho, em resposta ao conflito em Gaza.
Os ataques impactam diretamente o acesso ao Canal de Suez e têm levado empresas de navegação a desviar os navios que vão para Europa e Estados Unidos para uma rota alternativa, pelo sul da África, um trajeto, sabidamente, mais demorado e caro.
As rotas da Ásia para a Europa e os Estados Unidos já vivem uma disparada de preços desde dezembro do ano passado, que podem ser ainda mais agravadas diante do último episódio do dia 11/01, após ataques aéreos dos Estados Unidos e do Reino Unido contra bases dos rebeldes no Iêmen, como resposta aos eventos ocorridos no Mar Vermelho.
No Brasil, esse efeito é relativamente sutil, porque o preço dos contêineres vindos da China, país para o qual mais exportamos e importamos, estão abaixo do pico registrado durante o auge da pandemia (mas não necessariamente baratos), em que os valores de fretes da Ásia chegaram a superar os US$ 10.000 por contêiner.
Contudo, com os últimos acontecimentos, o setor atingido diretamente é o da logística. O desvio das rotas usadas costumeiramente atinge o preço dos fretes, e dependendo de como essa nova crise vai se desenrolar podemos, também, vivenciar’ um novo aumento da inflação. Isso pelo fato de o Oriente Médio ainda ser um dos maiores produtores de petróleo do mundo, logo, é possível que haja um novo cálculo da expectativa dos preços desse produto para 2024.
De acordo com o Conselho de Segurança da ONU, cerca de 18 companhias marítimas já decidiram redirecionar os seus navios em torno da África do Sul para reduzir os ataques aos navios no Mar Vermelho, consequentemente a crise causou uma redução de 25% no tráfego comercial através do Canal de Suez e um aumento de quase 150% nos fretes.
Sem contar que com o atual posicionamento do Irã diante do conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas, é possível uma volatilidade preocupante no preço do barril do petróleo.
Ademais, a importância do Canal de Suez está atrelada ao elevado trânsito de mercadorias que passam pelo canal todos os dias. A localização marítima estratégica, entre um importante mercado exportador, a Ásia, e um grande centro consumidor, a Europa, reflete-se na concentração de atividades comerciais no canal.
Com um conflito que atinge aquela região, é possível que passemos por uma nova falta de contêineres, já que muitos deverão ficar “presos” nos navios em trânsito por mais tempo. E esse cenário, nos conhecemos bem durante a crise sanitária: quando houve um cenário de escassez de contêineres no mundo, as empresas de navegação privilegiaram os serviços da Europa e dos EUA.
O Cônsul honorário da Finlândia e advogado, Gilberto Azevedo Lima, rememora que, não obstante o Canal de Suez já ter passado 8 anos inoperante, os preços se ajustaram, porque esse comportamento é uma tendência da economia, já que os fretes no atual contexto geopolítico devem encarecer para o mundo todo. Além disso, nunca é demais ressaltar que diversos navios desenvolveram sistema de defesa contra a pirataria na costa oeste da África, para fazer o contorno no Cabo das Tormentas, situação que, também, acaba por majorar preços, mas não chega a colocar o comércio internacional em um risco de colapso. Apesar de se tratar de situações difíceis.
O contexto do operador do comércio exterior, no Brasil, contudo, merece atenção especial. Isso porque, não bastasse os reajustes dos preços de armazenagens que os importadores recebem dos terminais portuários, a alta nos insumos, aumento da carga tributária e a atual greve da receita federal do brasil (situação que já deveria ter sido regulamentada pelo Poder Executivo Federal), agora veremos os valores dos fretes crescerem consideravelmente e é provável que a situação piore se o preço do barril do petróleo aumentar.
Enquanto isso, um novo porto que a China constrói no Peru pode ser uma porta do Brasil para o Pacífico, com um potencial de gerar ganhos significativos para as exportações nacionais. O projeto deve encurtar em um terço o tempo médio que a produção brasileira leva para chegar ao Oriente. Contudo, para aproveitarmos isso bem, o Brasil teria que investir em infraestrutura e facilitações logísticas.
É como dizia o poeta britânico Philipi Sidney: “ou eu encontro o caminho ou eu faço o caminho”. Me parece que os chineses sempre estão a desenhar suas rotas, mesmo quando o mundo está em crise…