QUARESMA: IMPELIDOS AO DESERTO

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A celebração central da fé e experiência cristã é a Páscoa do Senhor Jesus, sua morte e ressurreição. As Igrejas Católicas, Ortodoxas e da Reforma, chamadas igrejas históricas ou Comunidades Cristãs, celebram a Quaresma em preparação para a Páscoa.

A Igreja, na sua pedagogia divina, desde os primórdios, dedicou um tempo especial de quarenta dias para preparar nos corações dos fiéis a grande solenidade. Esse tempo litúrgico é chamado de “Quaresma”. Durante esse período, através da oração, do jejum e da esmola, cada um de nós é convidado à conversão, morrendo com Jesus para a vida velha do mal, a fim de, na Páscoa, verdadeiramente ressuscitar com Ele para uma vida nova no bem.

O evangelista Marcos nos proclama que “o Espírito Santo impeliu Jesus para o deserto. E Ele esteve no deserto durante quarenta dias, sendo tentado por Satanás; e vivia entre as feras, e os anjos o serviam” (Mc 1,12-13). Naquele tempo, o Espírito impeliu Cristo ao deserto. Hoje, esse mesmo Espírito impele o Corpo de Cristo, que é a Igreja, ao deserto da Quaresma para, com sua Cabeça, Jesus Cristo, lutar e vencer a Satanás. Nessa luta, somos mais que vencedores graças Àquele que nos amou.

Ir ao deserto é um confronto consigo mesmo, com o meu “eu” verdadeiro, sem máscaras e despido. Nele, encontramos feras e anjos. Nesse mundo agitado e superficial, consciente ou inconscientemente, evitamos esse encontro. Há em nós anjos e feras, qualidades e limites, erros e acertos, bondade e iniquidade. Não podemos cair naquela tentação de achar que não temos valor e ficar caídos nos complexos de inferioridade, pensando que não somos ninguém. Também não devemos nos vislumbrar achando que somos o máximo, perfeitos e totalmente santos. O deserto me ajuda a não ir nem para um lado nem para o outro. É um lugar de ajuda para o equilíbrio do meu ser.

Porém, essa unidade interior — que é uma busca pela vida inteira até o último suspiro — não acontece se eu não travo, com sinceridade, humildade e carinho, a luta contra os meus demônios e a vitória sobre eles. Na solidão do deserto, não estou sozinho. Foi Deus quem me levou até ele. Cristo foi levado ao deserto movido pelo Espírito. Eu também. “Eu mesmo, o Senhor, vou te seduzir ao deserto, e falar-te ao coração” (Os 3,16). Não estou só. Estou com Cristo, e, conduzido pelo Espírito, estou mesmo no centro do coração de Deus. A Quaresma é esse momento litúrgico e mistagógico de lutar e vencer.

“No momento favorável, eu te atendo, e no dia da salvação venho em teu socorro. Eis agora o momento inteiramente favorável. Eis agora o dia da salvação!” (2 Cor 6,2). A Quaresma é esse “agora” de Deus em nossas vidas. Tempo favorável, dia de salvação. Assumo minha grandeza e pequenez, santidade e pecado. Aceito com amor os meus limites, procurando superá-los ou conviver com aqueles que não mudam, mas se transformam mesmo assim em fonte de energia. “Quando sou fraco, então é que sou forte” (2 Cor 12,10). Também reconheço os meus pecados e, nesse momento inteiramente favorável, profundamente arrependido, confesso os meus pecados e recebo o amor de Deus, que não somente me perdoa, mas converte a minha vida e transforma o meu coração.

Quaresma. Todos, sem exceção, deixemo-nos ser envolvidos pela misericórdia das entranhas maternas do coração de Deus. Por maiores que sejam os nossos pecados, maior, bem maior, é o perdão de Deus. “Se o nosso coração nos acusa, Deus é maior que o nosso coração” (1 Jo 3,20). “Ele sustenta aquele que vacila e levanta todo o que tombou” (Sl 144,14). Ele perdoa inteiramente nossas faltas, cura-nos de nossas feridas e de nossas maldades, nos cerca de carinho e de ternura, nos nutre de força para vencermos as tentações e nos faz sempre jovens como a águia.

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