Atendendo ao gentil convite do prezado amigo Jornalista Rhaldney Santos, estarei, com prazer, interagindo periodicamente com os distintos leitores deste Blog.
O primeiro tema escolhido trata de “Um Cerimonial Tradicional e Moderno”.
Convido Vossa Senhoria a compartilhar sobre este tema sem cerimônia.
Será que podemos desenvolver, nos dias atuais, um cerimonial que mantenha a fidelidade dos ritos tradicionais e, ao mesmo tempo, seja considerado moderno?
É sobre este, à primeira vista, paradoxo, que tentarei discorrer neste artigo com a intenção de fomentar a discussão sobre o tema.
Todos aqueles que se interessam por essa atividade ou que exercem no dia a dia, quer como participante, quer como organizador destes eventos solenes, hão de concordar que o cerimonial tem como uma de suas funções básicas manter a tradição, permitindo a preservação dos ritos e a valorização da história, promovendo a beleza e dando realce aos atos do cotidiano.
Nos acontecimentos solenes a que nos referimos, que podem ser uma simples troca de cargo (cerimônia de posse), inauguração, homenagens diversas ou um acontecimento social (casamentos, bodas, batizados, aniversários, jantares e almoços solenes), a harmonização da prevalência dos ritos protocolares com a necessária adequação aos detalhes que a modernidade está a exigir urge que sejam observados.
Como afirma nosso saudoso colega acadêmico, Embaixador Augusto Estelita Lins, “o cerimonial era visto do ângulo historiográfico como uma das características das civilizações e da civilidade. Só recentemente, contudo, se começou a estudá-lo, a analisá-lo e a criticá-lo enquanto ciência da linguagem, do comportamento e do exercício do poder”.
É sob o ângulo do seu estudo como ciência da linguagem e do comportamento que gostaria de enfatizar algumas observações. Dentre outros aspectos a que vou me deter para estabelecer um paralelo entre a tradição e a modernidade, o primeiro deles é o tempo, general que comanda, hoje, a maioria de nossas ações. Na atualidade, em todas as esferas do poder público, como também na área empresarial, os responsáveis pela organização dos eventos solenes têm que se desdobrar para satisfazer a este imperador da vida moderna.
Tudo que se puder fazer para que as solenidades sejam as mais enxutas possíveis, sem se quebrar os ritos que a tradição e as convenções legais exijam, deve ser empregado. Constantemente, quando estamos organizando eventos solenes, somos procurados por pessoas ligadas ao evento para que seja incluído no roteiro das mencionadas solenidades, inserção de vídeos, sem a preocupação com o tempo de duração, entrega de placas, ramalhete, declamação de poesia, números musicais, entre outros que não estão previstos no roteiro original do evento.
Como exemplo, poderíamos citar as solenidades de posse dos Presidentes dos Tribunais, em que a maioria dos seus regimentos internos prevêem que usarão da palavra, para saudar o novo dirigente, um membro da respectiva Corte (Desembargador ou Ministro), um representante do Ministério Público e um representante da OAB, nestes casos, não se pode suprimir uma das falas sob pretexto do tempo, pois elas são protocolares e formais. No máximo, pode-se sugerir, sutilmente, aos oradores um determinado tempo para seus respectivos pronunciamentos.
Porém, o que mais altera esta relação e que contraria o estabelecimento harmonioso entre a tradição e a modernidade, agredindo o fator tempo, é a duração dos discursos. Como afirma o Aurélio, “discurso é a peça oratória proferida em público ou escrita como se tivesse de o ser”. Aí que residem dois grandes perigos.
O primeiro é a inclusão de pessoas que não estavam previstas em fazer uso da palavra. Isto dificilmente ocorre nas cerimônias do Judiciário e no Cerimonial Militar, porém, são frequentes nos cerimoniais dos poderes Executivos e Legislativos. A outra preocupação é a duração destas falas, me refiro aos que estão, protocolarmente, já inscritos como oradores.
No dizer do Embaixador Estelita, “na linguagem fonética já se aboliram os longos discursos literários e demagógicos”. Os dirigentes públicos de todos os poderes, como também os grandes empresários e executivos, não dispõem do tempo que os eloquentes oradores acham que eles têm para ouvi-los.
O mesmo autor Estelita nos adverte que, “na linguagem semiológica já não se toleram nem apreciam os abusos do luxo, exibição e pedantismo. A grandiosidade e os jogos de luzes se reservam, hoje em dia, para o cerimonial dos Jogos Olímpicos e para outros mega eventos que raramente envolveriam matéria de cerimonial, tais como, os grandes concertos de música ‘pop rock’ e os desfiles das escolas de samba”.
Por tudo que tentei expor neste artigo, espero expressar a intenção em alertar aos cerimonialistas que estão no “batente” como eu, e também àqueles que pretendem ingressar neste nobilitante campo de atividade, a possibilidade de harmonizarem o tradicional com o moderno.
A preocupação com o tempo, a simplicidade em contrapartida à ostentação, o respeito às tradições regionais e a busca da emoção devem ser objetivos constantes. Hoje, é perfeitamente admissível que se possa cultuar a música, a poesia e outras manifestações artísticas populares, perfeitamente harmonizadas com os roteiros do evento solene, sem agredir ao tempo e aos ritos protocolares.
Portanto, depende de nós o estabelecimento destes elos fundamentais ao sucesso da realização de um evento solene que é nosso principal objetivo.
Olho no tempo! Olho no roteiro! Cuidado com as nefastas modificações de última hora e bom evento para todos.
@francklin.s
francklinsantos@hotmail.com
Este artigo é dedicado “In Memoriam” ao estimado colega Acadêmico Embaixador Augusto Estelita Lins.
Referências:
LINS, Augusto Estelita. Evolução do Cerimonial Brasileiro. Brasília, 1929. Comunigraf Editora. 194p.